Quando surgiu a vontade de ser locutora?
Falei do sonho de ser engenheira de petróleos, esse era realmente o sonho, fui ‘corrompida’ (risos), mas sempre tive o hábito de ler em voz alta, e de fingir ser da TV, naquele exercício de baixa e levanta a cabeça – não havia teleponto (só para situar o contexto).
Aos jovens que querem seguir esta mesma profissão que conselhos lhes daria?
É um mundo que tem atraído muito os jovens, mas, infelizmente, muitos deles vêm mal preparados, mesmo em matéria de língua, linguística e cultura geral, sem gosto ou interesse por leitura. Tenho dado muitas formações em técnicas de locução, reportagem, entrevista e realização e produção de programas e insisto com eles para investirem em si de forma a colmatarem as suas lacunas. Por outro lado, temos bastante criatividade. Há que ser aproveitada e bem direcionada.
Entre as 09h00 e as 12h00, os ouvintes ouvem-na todos os dias. Contam com os seus vastos anos de experiência. Cada emissão continua a ser desafiante ou já é algo tão natural que nada a amedronta?
No dia a dia já não. Mas há dias de frio na barriga. Quando são novos projetos a ir ao ar, pela primeira vez, é um jogo de adrenalina e de responsabilidade de não errar, de não fazer feio e de conquistar o outro lado, a audiência de uma população extensamente jovem. É uma constante reinvenção e atualização.
Está na RNA há quantos anos? De que forma acha que as rádios evoluíram nestas últimas décadas?
Vou fazer 38 anos de rádio, no dia 15 de março, altura em que oficialmente fui considerada funcionária da RNA. As rádios evoluíram sem margem de dúvidas, na parte técnica e tecnológica. É incomparável. Mas em termos de rigorosidade, tanto na escrita (em crónicas e criação de diálogos, por exemplo), como na palavra falada (dicção, vocabulário…), com as suas raras exceções, regrediu.
Trabalhar em rádio trouxe-lhe só coisas boas?
Cresci na rádio, foi lá que me tornei mulher. Foi o meu primeiro e quase único emprego. Foram várias as fases pelas quais passei, e ainda passo... Na mudança de tempos e convívio com várias gerações, as coisas não hão de ser sempre boas. É com humanos que trabalhamos.
Hoje, o papel que as mulheres assumem no mundo da rádio é visto com outros olhos?
É muito interessante que a rádio sempre tenha estado na vanguarda da luta e conquista dos direitos da mulher, a começar, inclusive, por um programa nos anos 80, dirigido essencialmente à mulher. Quando cheguei à RNA, era uma mulher que comandava tudo o que tinha que ver com a programação – a eterna Diretora de Programas Maria Luísa Fançony. Eterna porque, até hoje, mesmo sem o ser de muitos, ainda a chamamos assim: Diretora. Nos tempos de hoje, as mulheres ocupam alguns cargos, mas se olharmos para a quantidade de rádios em Angola, são poucas as mulheres à cabeça. Na própria administração da RNA, nunca houve uma PCA e, muitas vezes, as poucas que ocupam os cargos de administração vêm de fora, são extra RNA.
«A comunicação social no mundo (onde Angola se insere) precisa de uma remodelação»
Qual a sua opinião sobre a comunicação social, no país e no mundo?
A comunicação social no mundo (onde Angola se insere) precisa de uma remodelação, deixou de ser inocente, deixou de ser humana, não obedecendo aos critérios de imparcialidade e de informar com verdade. Enquanto grupos de poder, tanto a nível político como financeiro, a comandarem, ela servirá apenas interesses desses grupos. Isso tem levado a que profissionais e os media caiam em descrédito e as pessoas se informem nas redes socias, estando sujeitas a serem igualmente levadas em erro pelas Fake News. Mas é aqui, às redes sociais, aonde também os media tradicionais devem recorrer, pois o feedback do seu público chega em forma de opinião. O ouvinte, o leitor, o telespectador quer ser partícipe desse tema abordado.
O que representa para si ser locutora de rádio?
Rádio é um mundo de emoção para quem a faz e para quem a ouve. É o locutor que é o elo entre o ouvinte e aquela caixa, hoje, ainda em forma de rádio, mas também de telefone, de tablet, de televisão, de computador... Cabe ao locutor saber passar todo um trabalho feito com entrega total de todos. Um bom locutor pode salvar programas de uma má realização, um mau locutor pode estragar bons programas, pelo que este último não deverá sequer ir para o ar.
Quais devem ser as principais características que um locutor deve ter?
Sempre aprendi que deveríamos ser, de facto, um cidadão-modelo, de conduta exemplar, sem escândalos e polémicas à volta da nossa vida e presença no espaço público. A nossa rádio ainda é muito de caracter formativo e cabe-nos passar essa mensagem, esse conhecimento, esse conselho. No lado técnico, um rico vocabulário, excelente capacidade de leitura e interpretação, discurso eloquente, boa dicção, boa projeção de voz, uma boa capacidade de memorização, cultura geral vasta, atenção aos fenómenos políticos, económicos, sociais do seu país e do mundo. E, se a tudo isso se aliar uma voz magnífica, não tem como não ser «querido» do público. É importante transmitir simpatia na sua voz, o ouvinte tem de sentir empatia por aquela voz que ouve.
Celebramos o 13.º aniversário da revista Villas&Golfe, em Angola. O que representaram para si estes últimos 13 anos, na sua vida e no país?
A Villas&Golfe é revista necessária para um público-alvo como é o seu, uma classe exigente, de requinte e glamour, de cultura, nas suas variadas vertentes. E tem tido a capacidade de satisfazer as expectativas de quem olha para a capa e começa a folheá-la, seja na sua forma convencional ou ainda num click.